Ouvi uma frase, a pouco, que me causou estranheza e repulsa. Em mais um evento, nesta cidade média do Brasil, que cresce mais que fungo em prato sujo deixado na pia, ouço uma senhora da mais alta sociedade local proclamar, no auge de seus 80 esplendorosos anos de vida, ao tentar convencer alguém a parar de fumar, sobre uma funcionária que houvera em outra época trabalhando pra ela, de que enquanto a tal funcionária lhe servia, com seu trabalho, ela servia a funcionário com o SEU dinheiro. E declamou a frase com tamanha solidariedade e soberba, que ao mesmo tempo me causou estranheza e repulsa. Vamos descrever melhor meus sentimentos.
Fico cada dia mais impressionada com a capacidade que as pessoas tem de convencerem-se, com pequenos, pequeníssimos gestos, de que estão fazendo a sua parte para o bem da humanidade. Como por exemplo o uso das tão aclamadas e polêmicas eco-bags. Bom se você, leitor, desavisado não sabe o que são, pois vou lhes explicar, as eco-bags surgiram como uma alternativa ao uso de sacolas plásticas de supermercados, essas sacolas são produzidas de um material mais resistente, que as torne retornáveis, ou de um material biodegradável, para que não poluam tanto quanto uma sacola de polietileno, grande vilão da era dos frascos não-retornáveis. Essa proposta é nova? É inovadora? É óbvio que não! Você já pensou como as pessoas iam no mercado antigamente? Quando não existiam os polímeros? Quando as embalagens eram retornáveis? Sim existiu e não faz tanto tempo assim, uma época em que era preciso levar a sua garrafa de vidro ao mercado para levar o seu leite pra casa. A sua sacola de palha, ou o seu carrinho de feira para levar as compras embora. Ah tá, agora tu tá me dizendo que as pessoas tinham que levar os seus recipientes de casa pra poder sair com os produtos do boteco? Sim, é isso que estou dizendo, e mais ainda, que esse tempo está voltando. Porque não é simplesmente substituindo as tão culpadas sacolas plásticas pelas novíssimas eco-bags que iremos acabar com o problema da quantidade excessiva de plástico, polímeros, polietilenos, poliestirenos, que o nosso estilo de vida, descartável, está gerando. Será preciso uma ruptura muito maior, e mais substancial com toda a cadeia produtiva, para que alguma mudança significativa seja percebida na quantidade de lixo que geramos. Não é indo ao mercado com nossas eco-bags, e nos seus interiores contiverem garrafas pet, potes de margarina descartáveis, sacos plásticos separando cada um dos hortifrutigranjeiros que decidamos levar pra casa, que oportunizará essa mudança para um estilo de vida sustentável. As empresas, as grandes corporações vendem essa ideia, e a sociedade compra, e exibe orgulhosa sua eco-bag customizada nos mercados da cidade, como forma de enaltecer seu espirito solidário, como forma de sua adequação à sustentabilidade, à modernidade. E não se questiona, aceita novamente calada a imposição de um novo costume, da palavra da moda. E não percebe que essa é uma resposta pronta, direcionada, que as permite continuar devastando e produzindo ainda mais lixo, isentas de culpa, porque afinal elas avisaram, até te convenceram que plásticos eram ruim, porque você sabia, e optou por trocar as suas sacolas, mas não as embalagens.
O que também me causa espanto é como as pessoas tem a capacidade de se apropriar, e se sentirem confortáveis com coisas tão fugazes e insubstanciais, por que afinal de contas o que é o dinheiro? Além de algo fugaz e insubstancial? O que faz, no nosso tempo, alguém merecedora de ter mais ou menos dinheiro? Estou vendo o meu leitor se contorcer na cadeira ao ler minha frase, mas ela traduz exatamente o que eu penso. Por que eu mereço ter mais dinheiro do que o caixa do supermercado, que me vendeu a eco-bag, que trabalha de 8 à 10 horas diárias? O que me faz ter mais poder de compra? O que é herança? Você já se perguntou o que é o dinheiro? Bom, eu já e nenhuma resposta me convenceu que eu sou mais merecedora de tê-lo do que qualquer outro habitante deste planeta. O que faz alguém pensar que pode trocar serviços por dinheiro? Não se troca serviços por dinheiro. Se troca por serviços por comida, por moradia, por outros serviços, o dinheiro é só o intermediador do negócio. Mas e aí, alguém pode me responder aonde foi que ele adquiriu esse status de Deus?
Não me surpreende mais essa sociedade viver tanto de aparência, o dinheiro é também um "ent" (ser) criado para parecer. Para parecer comida, parecer educação, parecer saúde, parecer moradia, parecer... Não me surpreende mais as pessoas se tornarem cada vez mais descartáveis umas as outras se vivemos numa sociedade que descarta tudo inclusive a si mesmo.
Me choco a cada dia mais por me tornar mais lúcida em um mundo de cegos. Não me choco tanto pelos problemas, mas pela cegueira alheia. Torço para que a cada manhã mais pessoas recuperem suas visões e se tornem conscientes de que fazem parte da sociedade e se responsabilizem por ela. Nós somos parte do problema e somos também parte da solução. Acorde você também!!!
Atualização:
Acho que as pessoas começaram a acordar vejam a agradável surpresa que assisti hoje: http://www.facebook.com/quemseimportaofilme?sk=app_190322544333196
Hm, discordo em partes. Vejamos:
ResponderExcluirEm um capitalismo ideal (se existe o tal socialismo ideal, comunismo ideal, que nunca foram implantados, também deve existir, e se não existia considere criado, o capitalismo ideal) o dinheiro EM SI continua não sendo nada, ele representa apenas uma espécie de "crédito de contribuição" que cada um tem perante a sociedade. Através de meu trabalho, eu dei "x" para a sociedade, esse "x" é representado pelo dinheiro que eu guardo na carteira ou no banco. O cidadão "A" merece ter mais dinheiro que o cidadão "B" sempre que der mais contribuição à sociedade do que este último, seja em quantidade ou em qualidade.
Quanto à primeira parte, das eco-bags, concordo plenamente, é ridículo ver esse povinho metido a fashion andando de sacolinha ecológica achando que está "fazendo a sua parte". É tão ecológico quanto carro elétrico - que economiza gasolina sacrificando as florestas de onde se tira a lenha que alimenta as usinas elétricas...